Artigo publicado por: Yuri Bittar
Não meus amigos, não estou falando de nenhum fotógrafo "mão-de-vaca", e nem da situação da fotografia no Brasil. Este título, na verdade, refere-se à atração que grande parte dos fotógrafos, por todo o mundo, e mais ainda por aqui, tem pelo tema social, mais precisamente pela miséria e pelo sofrimento humano. E é isso que quero discutir.
No Chão da Cidade - 2007
Foto: Yuri Bittar
Foto: Yuri Bittar
A proposta desta coluna, é incentivar, ou reforçar, a idéia do fotógrafo em tempo integral, ou seja, sugiro à todos, amadores ou profissionais, que fotografem todos os dias, o tempo todo, e não só com as câmeras, mas também com o olhar e a mente. E uma de minhas propostas foi a de andar pela cidade, fotografar a realidade, as composições que vão se formando o tempo todo. E nessas composições, numa cidade como a minha, São Paulo, constantemente estão presentes os mendigos, moradores de rua, pessoas doentes, crianças, e todo tipo de gente, infelizmente, em situação miserável.
Alinhada ao chão, desalinhada à sociedade.
Des-alinhada - 2008
Foto: Yuri Bittar
Des-alinhada - 2008
Foto: Yuri Bittar
Mas um fato é que não fotografamos a miséria só porque ela está lá ! Fotografamos também porque a procuramos, vamos em seu encalço, andamos pela rua procurando mendigos pelos cantos.
Outro dia um amigo me mostrou as fotos que fez de um morador de rua, não me lembro bem da história, mas ele conversou com o sujeito, e descobriu uma pessoa inteligente e culta, por detrás daquela aparência suja. As fotos ficaram boas, mas o que ele aprendeu foi ainda melhor.
Imagine a cena, um jovem estudante, no início de seu curso de fotografia, então seu professor manda os alunos para a primeira saída fotográfica, cada um deveria fazer fotos na rua, por conta própria.
E agora? O que ele faz ? Ele vai andar alí por perto, e se depara com a bela igreja da Consolação, com seu estilo neo-gótico-semi-barroco. Aquelas abóbodas altas e imponentes na entrada. Ele faz uma foto. Então percebe que há vários mendigos por ali, e ele precisa de algo mais em sua foto. Nada melhor do que o incrível contraste entre a riqueza e a miséria não?
Então ele se aproxima de uma mulher, uma mendiga, não muito velha, apesar que é dificil imaginar sua idade, ele pergunta se ela faria um favor, de ficar em frente à igreja, para ele fazer uma foto, imediatamente ela pergunta "o que que eu ganho?". Aparentemente ela já era modelo profissional, então ele negocia e consegue a foto por um passe.
The Lonelines of a Long Distance Runer
A solidão de uma longa distância, Um longo caminho para a solidão, Um olhar perdido no horizonte...
Esse jovem era eu (ainda sou) e essa foi minha primeira foto na rua. Para todos os efeitos eu a considero minha foto n.1.
E porque eu contei essa história toda? Para mostrar o que se passou na minha cabeça. Tirar foto de mendigos foi a primeira coisa que pensei, fazer fotos de miseráveis parece ser natural. Mas porque temos essa atração pelo que mais queremos distância?
Ninguém quer ser mendigo, mas que atire a primeira pedra o fotógrafo que nunca fotografou um!
Foto: Yuri Bittar
Isso, ao meu ver, é em parte influência da nossa cultura visual. Qual é o fotógrafo iniciante que não admira Sebastião Salgado. Eu adoro também o Newman Sucupira, que faz uma espécie de foto-glamour de pessoas simples do interior. Além disso, estamos acostumados a ver matérias na TV, sobre a miséria, mendigos, etc...
Acho ainda que a fotografia com temática social faz muito sentido no Brasil, devido a nossa situação, de pobreza generalizada. Pega bem se preocupar e fazer fotos conscientes. Alguém que tem preocupação com a sociedade, se aprende fotografia, sai fotografando a miséria mesmo.
Sem falar que se andarmos pela cidade, para registrar a realidade, não tem como fugir, eles estão lá ! Mesmo que na maior parte do tempo algumas pessoas consigam ignorá-los, por ser dolorosa sua visão, quando vamos fotografar a cidade, abrimos os olhos e a mente, e nossa sensibilidade de fotógrafos deixa passar mais que o normal, enxergamos coisas belas que nunca haviamos percebido, mas também enxergamos a miséria, bem nos olhos.
Foto: Yuri Bittar
Esses dias recebi a "Câmera Viajante". Um projeto muito legal, desenvolvido pelo pessoal da lista Fotobrasil, que é uma câmera, compacta, que vai viajando e passando na mão de vários fotógrafos, e cada um faz sua foto e envia a câmera para o próximo. No final haverá uma exposição com todas as fotos, feitas por pessoas diferentes, em locais e até paises diferentes, mas com o mesmo equipamento. Aposto que vai haver muitas fotos de miséria, a minha é uma delas !
Não sou contra fotografar a miséria, pelo contrário, e ainda acho que devemos fotografar e pensar muito mais sobre esse tema.
Então é isso que vou continuar perguntando nessa coluna, se você já fotografou uma "composição da realidade" hoje? Espero que comece logo!
Boas fotos e até a próxima!
Contatos:
Yuri Bittar
Designer / Fotógrafo / Historiador
http://www.yuribittar.com
http://fotoideia.blogspot.com
http://www.2communication.com
9 comentários:
Muito bom, gostei do texto é um tema que não tem como deixar a visão passar despercebido.
Eu sempre gostei de fotografar a rua do jeito que ela é...ou do jeito que vejo.
Algumas fotos minhas de moradores de rua. Espero que goste.
http://www.flickr.com/photos/hudsonr/2798272514/
http://www.flickr.com/photos/hudsonr/2801786490/
http://www.flickr.com/photos/hudsonr/2785798374/
Olá,amigos.
O tema é bastante amplo. A minha opinião é que a fotografia é um instrumento a serviço do nosso tempo.Só não concordo com a exploração dessas maselas socias usando a fotografia de forma sensacionalista.
A sociedade acaba por procurar esconder o que não lhe agrada. Assim, reflete em todas as áreas essa concepção de realidade que ela cria, e fica dessa forma evidente o que são os chamados "excluídos". Na fotografia não é diferente. Quando apresentamos a realidade, muitas vezes chocamos os expectadores. E o mais incrível é que, no fim, todos convivemos diariamente com isso.
Alguns olham para essa realidade de cima para baixo, mas as câmeras imobilizam a visão da realidade em retratos que muitos insistem em não olhar, mas que na verdade estão ali: não abaixo, mas ao nosso lado.
Eduardo, obrigado pela honra de ter meu artigo aqui, valeu o apoio como sempre! Abraço!
aonde q c vota?
any way
amei as fotografias é um lado que as pessoas vêem tdos os dias , ma querem ver
Yuri,
Belo texto ( concordo c/ vc principalmente qdo diz q a sensibilidade do fotógrafo enxerga imagens q as pessoas "comuns" não conseguem perceber. E, principalmente, fotografar sem a câmera: com o olhar, a mente; isso é fundamental ).
Belas imagens ( gosto desse tema social; acho importante cada um fazer a sua parte e mostrar a realidade nua e crua, ainda q seja a "realidade" q o fotógrafo enxergou naquele momento ).
Tem muita gente q não compreende esse interesse de registrar a pobreza da maioria dos fotógrafos; algumas vezes fui criticada ou questionada por essas pessoas do porquê fotografar a miséria. Há inúmeros motivos para isso, mas nunca me esquecerei de uma pessoa, moradora de um bairro muito pobre e marginalizado, de uma cidade do interior, q pediu p/ ser fotografada, pois queria mostrar para a sociedade q ali, onde a grande maioria tinha pavor de passar perto, havia gente decente, honesta e trabalhadora. Esse é um desses motivos q me envolvem nesse tema: a história de vida e o q tem por trás do seu sofrimento, da sua condição, etc...e conseguir traduzir tdo isso através de uma imagem.
Enfim... discussão para a vida toda.
Parabéns pelo texto e pelas fotos,
Vanessa Salles Aro
Yuri,
Belo texto ( concordo c/ vc principalmente qdo diz q a sensibilidade do fotógrafo enxerga imagens q as pessoas "comuns" não conseguem perceber. E, principalmente, fotografar sem a câmera: com o olhar, a mente; isso é fundamental ).
Belas imagens ( gosto desse tema social; acho importante cada um fazer a sua parte e mostrar a realidade nua e crua, ainda q seja a "realidade" q o fotógrafo enxergou naquele momento ).
Tem muita gente q não compreende esse interesse de registrar a pobreza da maioria dos fotógrafos; algumas vezes fui criticada ou questionada por essas pessoas do porquê fotografar a miséria. Há inúmeros motivos para isso, mas nunca me esquecerei de uma pessoa, moradora de um bairro muito pobre e marginalizado, de uma cidade do interior, q pediu p/ ser fotografada, pois queria mostrar para a sociedade q ali, onde a grande maioria tinha pavor de passar perto, havia gente decente, honesta e trabalhadora. Esse é um desses motivos q me envolvem nesse tema: a história de vida e o q tem por trás do seu sofrimento, da sua condição, etc...e conseguir traduzir tdo isso através de uma imagem.
Enfim... discussão para a vida toda.
Parabéns pelo texto e pelas fotos,
Vanessa Salles Aro
Sinceramente não tenho muito com o que contribuir. Meu comentário a respeito do texto pode ser revelado em apenas uma palavra: realidade. Pra mim, este texto do YURI me tocou pela forma real que ele descreve a visão de quem começou ou irá começar pela fotografia.
A miséria atrai olhares. Não tem jeito.
Me admiro fugir deste cenário todos os dias.
Este espaço também é seu Yuri, desde que a sua contribuição seja tão significativa quanto esta. Parabéns.
Abraços
Eduardo Chaves
www.fotocolagem.blogspot.com
Realmente interessante o tema do texto, e não tem como não negar a busca por fotos com este tema.
Quem olhou a segunda foto (de cima para baixo) feita pelo Yuri verá uma semelhança na minha foto feita num passeio fotográfico, com o Yuri, em uma data diferente da que ele tirou a foto, mas a personagem (acredito) que seja a mesma.
http://www.flickr.com/photos/clickarteacao/3958579029/
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